Sinceramente, ando bem cansada de tantos remakes (mesmo os da Disney). Sinto falta dos tempos onde criar histórias era mais interessante do que apenas nos reter a nostalgias. Devo dizer que não vi o primeiro filme da década e 1960. Então aqui não haverá comparativos ao original, apenas meus pontos sobre essa versão de 2021. Não sei quem decidiu que colocar Romeu e Julieta como um exemplo de amor verdadeiro seria uma boa ideia, pois quem sabe e já leu a obra original, basicamente, é a história de dois adolescentes cheios de tesão que não sabiam nada da vida e cujo relacionamento praticamente extinguiu as duas famílias inteiras, sem falar na morte dupla. Não é sobre amor, é sobre inconsequência. Por isso o conto é conhecido como tragédia de Shakespeare. Bem, então West Side Story é a história de uma paixão entre dois jovens, Maria (Rachel Zegler) e Tony – Anton (Ansel Elgort), sendo Maria uma porto-riquenha, e Tony um ianque, que faz parte da gangue dos Jets. A rivalidade entre os jets e os porto-riquenhos vem tomando proporções grandes demais para haver um acordo entre eles, então esse fato torna o súbito relacionamento de Tony e Maria ainda mais impossível. E com os rivais entrando em guerra, a tragédia entra em cena para atrapalhar os dois pombinhos.
Produções de West Side Story
A primeira vez que a produção chegou ao público foi através do musical da Broadway em 1957, dirigido e coreografada por Jerome Robbins e produzida por Robert E. Griffith e Harold Prince, com canções de Leonard Bernstein e letras de Stephen Sondheim. A peça foi indicada para seis Tony Award (prêmio máximo do teatro, equivalente ao Oscar para o cinema), incluindo Melhor Musical em 1957. Logo depois do sucesso do musical, foi então lançado a versão cinematográfica que todos conhecem, em 1961, e foi tão grande sua aclamação, não apenas entre o público, mas para a critica especializada também. O filme foi vencedor de 10 Oscars, incluindo o de Melhor Diretor, Melhor Filme, e Melhores Ator e Atriz Coadjuvantes. E Rita Moreno, que fez o papel de Anitta, foi a primeira mulher latina a vencer a premiação.
Os problemas na narrativa
Primeiro que, ao se falar de um remake de um filme da década de 1960 para 2021, eu esperei muito mais algo atual. O filme ainda se passa na década de 60. Pontos para os figurinos que são de arrasar! Mas, sinceramente, o apelo da história não me encantou em nada. Nunca fui uma pessoa encantada por histórias súbitas de amor, então não, não gosto da obra de Shakespeare. Os rápidos dois dias em que Maria e Tony se conhecem “e se apaixonam perdidamente” me parecem ainda piores vendo pelos olhos atuais. Ninguém pode amar em dois dias. Amor vem de uma longa jornada de construção. Se era pra ser romântico, para mim não deu certo. Dá pra entender o interesse um no outro. Maria é uma garota bonita, inteligente e muito capaz, e Tony tem seu charme. Então vejo o apelo para um interesse, e não a paixão avassaladora que o filme quer te vender. Mas tudo se torna ainda pior quando Maria ainda aceita Tony mesmo depois do irmão morrer, sabendo o que ele fez, e não apenas isso, mas ainda dorme com ele! Toda a construção de fazer a personagem ser minimamente inteligente é jogada no lixo nessa cena, e a faz parecer ainda mais ingênua e tola, como uma adolescente de 14 anos (olá Julieta!) e não a mulher que diz ser com seus 18 anos. Por que não explorar e desenvolver de uma forma mais consistente o relacionamento dos dois? Eles saem uma única vez para um encontro, e lá eles basicamente se “auto-casam” (!!!) e eu fiquei sem entender nada! Como assim querem se casar? Vocês acabaram de se conhecer! Spielberg e o roteirista Tony Kushner tiveram a oportunidade de criar uma história que pudesse ser olhada pelos olhos atuais, mas preferiram se estagnar na década de 1960. Isso para mim foi o ponto mais decepcionante. Existe uma cena que foi certamente criada para ser impactante e é a única que funciona. Rita Moreno, que está presente nesse filme vivendo a Valentina, como dona do Doc’s, salva Anita dos Jets depois de uma cena de assédio, e os chama claramente de estupradores, além de ter as outras meninas também lutando para que os caras não a machucassem. Foi o mais perto de alguma emoção positiva que senti no filme. Foi uma cena muito bem construída e, pelo que me informaram, uma resposta ao filme original onde a personagem de Moreno sofre o mesmo.
Atuações a desejar
Ansel Elgort é um cantor muito melhor do que eu pensava que ele seria, mesmo não sendo tão bom assim, mas sua versão de Tony está sobrecarregada com a história de não apenas ir para a cadeia por um ano, mas por quase matar alguém. Você precisa adicionar uma bandeira vermelha adicional a um personagem para torná-lo mais interessante para prenunciar que ele vai matar Bernardo (David Alvarez)? Maria, interpretada de forma convincente e cantada com gosto por Rachel Zegler, e ela tem muito mais tempo de tela do que suas outras versões da mesma história. Ela cantando “I feel pretty” na loja onde ela trabalha como faxineira com certeza foi o que rendeu-lhe o papel de Branca de Neve na Disney. Mas mesmo que ambos sejam minimamente interessantes em seus papeis, eles têm zero química em tela. Elgort não entrega a paixão necessária para te convencer de que eles estão realmente apaixonados. E mesmo Zegler sendo tão incrível com sua voz, ela não me convenceu de sua paixão. Eu não poderia me importar menos com eles, mesmo que a história seja sobre eles. Eu fiquei muito mais interessada em saber sobre a vida desses jovens, que precisam lutar pra sobreviver em um mundo que não os apresenta oportunidade, em saber mais sobre Anita e seu sonho de virar uma grande estilista do que no romance tórrido entre Maria e Tony.
A Beleza da Filmografia
Apesar de todas as lutas que este filme tem, há algumas coisas que ele acerta de forma absoluta. Mike Faist é incontestável como Riff, o líder dos Jets. Do canto à atuação, Faist tem uma das melhores apresentações do ano. Ele é absolutamente magnético em qualquer momento que está na tela, conseguindo canalizar a aspereza externa e colocar a bravata que precisa para vender esse personagem. Além disso, a encenação e o sequenciamento da música foram bem estelares. Ironicamente eu achei muito mais interessantes as interpretações de dança que todas as músicas cantadas. Momentos em que os personagens apenas dançavam falavam muito mais do que qualquer letra do filme. É claro que não posso deixar de enaltecer o figurino desse filme e a escolha da paleta de cores que é excepcional, linda e de tirar o folego. Uma verdadeira obra de arte. A cena de Anita e as outras mulheres dançando ao som de “America” é um verdadeiro espetáculo aos olhos. E tudo isso somado à fotografia que é espetacular. O que falhou em história e química entre os atores principais, acertou em conceitos técnicos. Ironicamente, a música America – que ficou muito conhecida pela peça e depois pela adatação de 1961, é uma chave do “sonho americano” vendido a torto e a direito pelo marteking americano. As mulheres cantam sobre a vantagens de viver nos EUA, enquanto os homens respondem aos problemas estruturais do país em relação a oportunidades e racismo. E durante toda a letra que pende na corda bamba entre os elogios e as criticas, o show que segue com as danças é um verdadeiro espetáculo. E talvez para os amantes do filme original – e também para quem ama as peças de Shakespeare, essa nova versão de West Side Story funcione e seja traçada de elogios, mas não consigo imaginar uma história como essa funcionando em um público novo, ainda mais nos dias atuais. A ideia do amor, da parceria, e dos relacionamentos mudaram muito. E mesmo estagnado em um período em que essa ideia de “paixão avassaladora” funcionava, me parece – olhando com os olhos atuais, um pouco forçado demais. Ah e mais uma dica: se puderem assistam dublado ou em áudio original sem legenda. As traduções aqui estão sem pé, nem cabeça!
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