Com apenas 3 anos de existência e uma forte cultura de startup, é de lá que produtos como Gear Fit, Gear IconX (avaliado nesta análise completa) e Galaxy View foram criados. Mas qual é o ponto de partida? A gente explica, neste especial:
O Ponto de Partida
Grande parte das ideias usam as preferências do consumidor como base. Pensemos no Galaxy View, o tablet de 18,4 polegadas da Samsung, por exemplo. Quais pontos a Samsung levou em consideração para criá-lo? Em primeiro lugar, identificou que o percentual de pessoas que saem com o tablet de casa é pequeno. Isso permite que a empresa expanda suas funcionalidades além do que foi originalmente pensado para os tablets. Se é um produto que ficará dentro de casa, não há necessidade de diminuir suas dimensões. Pelo contrário, podem melhorar sua principal funcionalidade: consumo de conteúdo. E foi assim que a empresa chegou às 18,4 polegadas do Galaxy View. Uma tela maior melhora a experiência do usuário na hora de consumir conteúdo, em especial filmes e série do Netflix e outros serviços de streaming. Mais do que isso, permite a instalação de uma bateria maior, garantindo algumas horas extras de uso. Somando-se os dois, cria-se um “problema”: por ser grande demais, deve-se criar alguma forma posicioná-lo em alguma superfície, já que estamos falando de um produto que pesa 2,65 kg. Chegamos então no suporte embutido, especialmente ergonômico com um design que “esconde” sua região mais grossa, o que oferece um visual mais premium ao produto. Ou seja, mesmo grande, pode ser utilizado tanto em uma superfície quanto no colo.
Processo de criação
Geralmente, o processo de criação de um produto leva de 12 a 24 meses. Uma equipe de engenheiros, designers e administradores trabalha e conjunto para equilibrar cada aspecto de um produto. Por exemplo, pouco adianta ter uma bateria muito grande pensando na autonomia, mas que atrapalha a experiência de uso. Ou configurações top de linha e um design conceitual, mas que custe muito caro. Ou ainda um produto muito acessível, mas que seja pouco apelativo e comprometa o uso. Cada um dos especialistas leva em consideração todos esses aspectos, em seguida partindo para os primeiros protótipos. Não há um número específico de protótipos, já que eles são criados e modificados sob demanda. De modelos de papelão até refinamentos posteriores em uma impressoras 3D, que fica à disposição da equipe, os produtos começam a tomar forma até chegar em sua versão final. Em seguida, são testados por pessoas selecionadas e pela própria equipe, tanto para identificar possíveis falhas quanto para adicionar recursos que não foram originalmente considerados. A versão original do Gear Fit, por exemplo, passou por todas essas etapas, totalizando cerca de 18 meses no total.
O Feedback é Importante
Com o produto do mercado, a Samsung observa a resposta do usuário ao produto. De mensagens direcionadas à empresa até comentários e análises de produto (como as que fazemos aqui no Showmetech), tudo é considerado pelo SDA para desenvolver uma segunda geração. Ainda considerando o Gear Fit, 80% dos usuários sentiu falta de uma forma de controla reprodução de músicas através dele. Isso foi levado em consideração e incorporado ao Gear Fit 2, além de outros recursos, iniciando novamente o ciclo de feedback e incorporação. Esses ajustes ocorrem tanto via hardware quanto através de atualizações de software, como a parceira com o Spotify. Ainda segundo a Samsung, o SDA trabalha com 4 ou 5 projetos simultaneamente. Cada um deles conta com uma equipe de 3 a 4 pessoas, ou mais, dependendo do potencial do produto. Mas todos eles chegaram ao mercado? Nada disso: cerca de metade deles nem chegaram a ver a luz do dia. Seja pela falta de apelo, limitações tecnológicas ou problemas de precificação. Esse, aliás, é um dos grandes diferenciais que vimos no SDA. A equipe tem liberdade para errar, e erros não são vistos de forma negativa. Pelo contrário: revelam informações importantes para não errar no futuro, garantindo que produtos ainda nem pensados não contem com falhas.
Samsung Research America – SRA
O sucesso ou o fracasso de um produto vai muito além de suas características em si. Pouco adianta ter um produto excelente, mas limitado em funcionalidades. E é aqui que entra o Samsung Research America – SRA, com o programa Samsung Next. Ele trabalha diretamente com startups, ajudando-as a desenvolver ideias inovadoras em áreas que poucos consideraram. Com uma boa ideia em mãos, uma startup pode colaborar com a Samsung para transformá-la em um produto. É o caso, por exemplo, do dongle LoopPay, que acabou se transformando no Samsung Pay integrado aos principais modelos da empresa. Segundo a própria empresa, não havia planos de desenvolver um programa desse porte há 5 anos. Nesse meio tempo, considerando o sucesso do programa, ele acabou se transformando em uma estratégia fundamental de inovação da Samsung. De não considerar a compra de empresas há meia década, a empresa desembolsou nada menos do que US$ 8 bilhões (cerca de R$ 27 bilhões) na compra da Harman, incorporando uma das principais empresas de áudio do mundo para dentro da Samsung. Outros exemplos incluem o SmartThings (IoT) e StickiBoard, presente no Family Hub.
Quais são os critérios para a escolha de startups? A Samsung tem uma ideia geral dos planos futuros, incorporando empresas que atendem a sua linha de desenvolvimento. Um grande exemplo é a Viv, focada em inteligência artificial (Artificial Intelligence – AI – em inglês). Aliás, AI será o foco da empresa em 2017, segundo a própria Samsung. Não chega a ser uma surpresa, considerando os inúmeros rumores sobre AI no Galaxy S8. Mas há também algumas que chamam a atenção por ideias completamente diferentes (até malucas, alguns diriam) que acabam entrando no radar da empresa.
O que as startups ganham
Há quatro centros do Samsung Next pelo mundo. O que visitamos fica em Mountain View, e os outros três ficam localizados em Nova York, Tel Aviv e na Coréia do Sul, naturalmente. Mas o que as startups ganham ao trabalhar com a Samsung? Em primeiro lugar, trabalhar com uma empresa que contou com US$ 267,7 bilhões em receitas em 2015, sendo a sétima marca mais valiosa do mundo. Em segundo, a escala. A Samsung vende 44.000 smartphones por hora mundialmente, assim como 5.400 televisões. Ou seja, o alcance dessas novas ideias é global, para não dizer gigantesca. Em terceiro, o market share. A Samsung é a maior empresa do mundo em termos de venda de smartphones, refrigeradores, TVs e memórias em geral (RAM, NAND e SSD).
Aliás, um dos grandes diferenciais da Samsung é controlar cada componente de seus produtos. Seja a linha Exynos de SoCs de smartphones e tablets, seja chips de memória RAM, SSD e telas (Super AMOLED). Por saber exatamente como o hardware se comportará, a integração do software fica mais transparente. Um ponto especial para startups que trabalham com software, facilitando a sua otimização. Vale registrar que a Samsung não trabalha apenas com produtos voltados para o consumidor. Educação, saúda, agricultura, segurança, tratamento de água e até mesmo transporte: nada escapa do radar da empresa. Cada uma dessas áreas recebe sua devida atenção no DSA (Device Solutions America), no Vale do Silício.
DSA e Artik
Um dos grandes pontos que nos chamou a atenção é o Artik, plataforma de IoT da Samsung. Não se trata apenas de um componente único, mas de todo um ecossistema de hardware, software, cloud e segurança. Tudo começa com o chip, que esconde seu enorme potencial de tão pequeno. Além dos componentes presentes no Exynos (CPU, GPU, RAM, DSP), o Artik conta com memória interna e todos os controladores possíveis. Basicamente, falta apenas o I/O, tornando-o altamente versátil para ser utilizado com a maior quantidade de devices quanto possível. A Samsung tem um uma casa modelo dentro do próprio DSA para testar suas soluções com Artik. Entre os exemplos que vimos, temos uma chave inteligente, sensor de movimentos, sensor de contato (para alarmes, por exemplo), câmera remota e câmera noturna. Todos eles conversam entre si e podem ser controlados pelo smartphone ou tablet. Ou mesmo via voz, aceitando comandos para travar ou destravar portas através de um hub central. Mais interessante ainda são os processadores biológicos da empresa. É o caso do BP5A, que monitora resposta galvânica de pele, temperatura, impedância biológica, entre outros sinais.
Project Beyond
AI é o foco da Samsung em 2017, mas outras áreas também estão recebendo bastante atenção. Um dos mais interessantes é o Project Beyond, que conta com 16 câmera 4K divididas em 360º (um par a cada 45º) focado em Realidade Virtual (VR). Pensado para grandes empresas, ele permite um nível de imersão de altíssima qualidade em qualquer lugar. Já imaginou poder andar por Machu Picchu sem sair de casa, sem deixar de lado nenhum detalhe? Essa é a ideia do Project Beyond, um produto que promete muito desde 2014, e que está cada vez mais próximo de chegar ao mercado.
Ele representa o trabalho da Samsung “do outro lado”. Como dissemos, pouco adianta ter um produto excelente, mas sem aplicações que justifiquem seu uso. Investindo na produção de conteúdo com um produto dedicado, a empresa cria um mercado para seus produtos produtos VR. Entre eles, o Gear VR, naturalmente.
Conclusão
Por vezes, nos esquecemos dos inúmeros projetos simultâneos de uma empresa para conquistar o consumidor. Pensamos em um smartphone como um produto isolado, mas o seu sucesso depende de aplicações que criem a necessidade de utilizá-lo. Basta imaginar um smartphone top de linha sem o Google Maps, Snapchat, aplicativos de produtividade e funções que seriam consideradas sonhos de ficção há poucos anos. Basta considerar também que o iPhone fez 10 anos há pouco tempo. Essa visita à Samsung na Califórnia, percebemos que a empresa está trabalhando muito e investindo massivamente para se diferenciar dos concorrentes dentro de sua própria linha de produtos. O Galaxy S8, quando for anunciado (e escutamos “pistas” de que isso pode não acontecer na MWC), será mais do que um smartphone. Será um hub central que incorporará todos os serviços exclusivos da empresa. Uma porta de entrada para todos os investimentos da empresa, de inteligência artificial ao controle de cada funcionalidade da casa (no caso, o SmartThings). Mais do que uma oportunidade de conhecer como a empresa trabalha, como uma ideia vira um produto final, vimos o foco da empresa em inovação. Algumas empresas apenas anunciam smartphones, competindo com os concorrentes com uma “guerra de especificações”. Mas poucas realmente investem em recursos exclusivos, muitas vezes chegando à casa dos bilhões em ideias que podem demorar anos para ver a luz do dia. Se é que um dia verão. Infelizmente, por uma questão de confidencialidade, não pudemos registrar muitas das coisas que vimos. O que registramos aqui é um conjunto selecionado de assuntos, já que a quantidade de projetos é imensa, em especial quando consideramos os que não podem ser revelados. Mas tivemos uma boa ideia da quantidade de pessoas envolvidas, projetos revolucionários e dos focos da Samsung para os próximos anos. Considerando tudo, ficamos ainda mais ansiosos para a chegada do Galaxy S8, exatamente por ele ser a representação física de tudo o que a empresa está trabalhado. Alguns projetos, inclusive, durante vários anos. E, claro, compartilharemos as próximas novidades com você, assim que elas chegarem. *O jornalista visitou a Samsung na Califórnia a convite da empresa